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INDÚSTRIA DA PANIFICAÇÃO DEFINE ESTRATÉGIA PARA DEFENDER E VALORIZAR O QUE É “TRADICIONAL”

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Associações empresariais destacam vantagens nutricionais do pão confecionado ao gosto português numa alimentação saudável

A indústria nacional de panificação, que está a recuperar da crise e em 2016 teve vendas superiores a 585 milhões de euros, vai apostar numa estratégia de promoção da padaria tradicional para se diferenciar dos produtos embalados, em grande parte originários do estrangeiro, e valorizar a importância do pão na dieta dos portugueses. O sector dá emprego a cerca de 120 mil pessoas e tem a laborar mais de 10 mil unidades industriais, a grande maioria pequenas e microempresas de base familiar. A Páscoa, com as tradicionais bolas e folares, é uma das épocas do ano mais absorvente para quem nele trabalha.

Para dar corpo a essa “estratégia agregadora”, está em fase de conclusão um projeto, promovido pela Associação dos Industriais de Panificação, Pastelaria e Similares do Norte (AIPAN), que segundo o seu presidente, António Fontes, visa o “reconhecimento da tradição como fator distintivo” da oferta do sector, o reforço da sua “capacidade de inovação” e a “definição das tendências de consumo”, cada vez mais determinadas por novos e mais saudáveis hábitos alimentares, processos de fabrico tecnologicamente mais evoluídos e modelos de negócio que incorporem as dimensões gastronómica e cultural da panificação tradicional.

Nessa perspetiva, a indústria portuguesa de panificação está cada vez mais alinhada pelo Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável e aceitou o repto do Ministério da Saúde para reduzir a quantidade de sal no pão. E no princípio do ano assinou com o Governo, através do secretário de Estado Adjunto e da Saúde, um protocolo que prevê a outorga de um “selo de qualidade” aos fabricantes que, voluntariamente e antes de 2021, baixem o teor de sal no pão, do atual limite máximo obrigatório (1,4 g) para um grama apenas por cada 100 gramas de produto final.

Valorizar o pão fabricado ao gosto português

No âmbito deste projeto, denominado “O futuro da tradição”, a AIPAN leva a efeito no próximo dia 4, na Maia, o Congresso Internacional da Panificação Tradicional Portuguesa, cuja realização tem o apoio das outras duas associações empresariais do sector, a Associação do Comércio e da Indústria de Panificação, Pastelaria e Similares, com sede em Coimbra, e a Associação dos Industriais de Panificação, Pastelaria e Similares de Lisboa. O encontro contará com as participações de empresários e mestres padeiros, historiadores e investigadores, médicos e nutricionistas, decisores institucionais e profissionais ligados a várias áreas da fileira alimentar, bem como de alguns especialistas estrangeiros envolvidos em iniciativas de valorização do pão fabricado por processos tradicionais. Durante os trabalhos, intervirão o ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral, e o secretário de Estado Adjunto e da Saúde, Fernando Araújo.

“Está na altura de tentarmos antecipar o futuro, tirando partido do que há séculos sabemos fazer bem e do valor alimentar que historicamente os portugueses atribuem ao pão”, justifica o dirigente associativo.
“Com as alterações climáticas a condicionar cada vez mais a atividade agrícola, a diminuição acentuada das áreas de cultivo de cereais em Portugal, o crescente aumento das importações por parte das empresas moageiras e, principalmente, a entrada das principais marcas da moderna distribuição alimentar no negócio da panificação, com um tipo de produção em que quase tudo é feito por máquinas, com farinhas aditivadas e massas ultracongeladas, o fabrico artesanal e tradicional veio relançar as padarias de proximidade, recentrar a importância do pão numa alimentação saudável e elevar a ‘gourmet’ o produto final fabricado ao gosto português”, acrescenta António Fontes.

Um sector que conjuga tradição com alimentação saudável

É neste quadro que decorrerá a “reflexão prospetiva” que a 4 de abril, durante todo o dia, no Fórum da Maia, irão fazer cerca de 500 profissionais do sector, entre as quais uma dezena de técnicos, gestores e formadores estrangeiros, a maioria deles franceses, antecipa o presidente da AIPAN.

É o caso de Gérard Brochoire, antigo presidente do INBP - Institut National de la Boulangerie Pâtisserie, instituição que há muito dita as tendências de consumo de pão em França e é tida como referência europeia na formação, capacitação e investigação do sector. Ele e o seu compatriota Christian Rémésy, nutricionista especializado em nutrição humana, darão testemunho da experiência francesa, com a apresentação de um ‘case study’ sobre “O valor do pão tradicional no mercado francês”.

De França virão também o mestre padeiro e empresário Amândio de Vaz Pimenta, um lusodescendente premiado naquele país, e a antropóloga Mouette Barboff, autora de vários livros sobre produção tradicional e consumo de pão na Europa, incluindo Portugal, e gestora do website de divulgação histórica e científica “As civilizações do pão”.
Referência ainda para as participações de Barbara Elisi Caracciolo, uma padeira italiana radicada na Suécia que é especialista em panificação artesanal, e dos portugueses Mário Rolando, formador e mestre padeiro renomado, e Ana Soeiro, engenheira agrónoma que tem dedicado especial atenção à defesa e qualificação de produtos tradicionais portugueses. Atualmente, é diretora executiva da associação Qualifica/oriGIn Portugal.

Num painel que reunirá os nutricionistas Pedro Graça, diretor do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável, e Helena Real, secretária-geral da Associação Portuguesa de Nutrição, assim como o médico Manuel de Carvalho Rodrigues, presidente da Sociedade Portuguesa de Hipertensão, será abordado o tema “O pão na alimentação”.

Após a sessão de abertura do congresso, marcada para as 9 horas e em que discursarão os presidentes da AIPAN e da Câmara Municipal da Maia, António Silva Tiago, caberá ao presidente da Associação Empresarial de Portugal, Paulo Nunes de Almeida, fazer a caracterização do sector da panificação no nosso país.

O encerramento do encontro, previsto para as 17,30 horas, estará a cargo do secretário de Estado Adjunto e da Saúde e de Henrique Capelas, vogal da Comissão Diretiva do programa NORTE 2020, através do qual a AIPAN assegurou o cofinanciamento público necessário para executar o projeto “O futuro da tradição”. Entretanto, no reatar dos trabalhos, depois de um almoço temático que servirá para evidenciar a importância do “pão como base da alimentação”, o ministro da Economia partilhará com os participantes “A visão do Governo” quanto à valorização e promoção das atividades económicas tradicionais.

O alimento produzido em Portugal que mais vende

Apesar de o consumo ter decrescido no recente período do ajustamento da economia, os portugueses continuam a ter o pão no centro da alimentação. Segundo o Instituto Nacional de Estatística, em 2016 foi mesmo o principal produto alimentar vendido no nosso país. Gerou receitas de 585.197 euros, chamando a si 5,6% das vendas totais da indústria alimentar nacional. Por força de hábitos culturais enraizados e da tradição, é nos períodos da Páscoa e do Natal que a indústria de panificação mais trabalha e mais vende.

No entanto, a evolução relativamente ao ano anterior foi pouco significativa, tendo representado apenas um crescimento de 0,8%, muito abaixo da produção vendida pela fileira das indústrias alimentares, que chegou aos 2,8%. Mesmo assim, o pão foi, em termos de valor, o alimento produzido em Portugal mais vendido naquele ano.

Nos fornos das cerca de 10.260 unidades de panificação que a AIPAN calcula estarem a laborar em Portugal (37% na região Norte, 34% no Centro, 16% na área metropolitana de Lisboa, 6% no Alentejo, 4% no Algarve, 2% na Madeira e 1% nos Açores), foram cozidas há dois anos quase 425 mil toneladas de pão, que tiveram como principal destino o mercado interno. A quantidade efetivamente vendida, porém, ficou-se pelas 411 mil toneladas, mais 7,1% do que em 2015. As exportações estão a crescer, segundo o presidente da AIPAN, mas “pouco passarão dos 10% da produção total”.

Se a estes números se juntarem aqueles que refletem a confeção industrial de pastelaria, que gerou receitas de 482.974 euros em 2016, a expressão comercial das duas atividades (panificação e pastelaria) ganha um peso económico maior, superando os 1.068 milhões de euros.

No mesmo ano, um estudo internacional realizado em 17 países na União Europeia, incluindo Portugal, veio demonstrar que o consumo de pão está a cair e a desviar-se dos níveis recomendados por nutricionistas, organizações internacionais e responsáveis pelas políticas públicas na área da saúde.

Em 12 anos (entre 2004 e 2016), o consumo de produtos de panificação pelos europeus desceu de 67 para 63 quilos ‘per capita’. E no pão fresco, em particular, a queda ainda foi mais acentuada, assinalando-se um recuo de cinco quilos, com o consumo anual a diminuir de 51 para 46 quilos por pessoa.

Em sentido inverso, segundo o estudo, está a aumentar a procura pelos produtos da panificação tradicional, nomeadamente daqueles que assumem características “especiais” e “regionais e locais”. Os consumidores europeus que não dispensam o pão fresco preferem, aliás, este tipo de produtos, normalmente incorporando matérias-primas não processadas e obtidos das amassaduras, fermentações e cozeduras que seguem receitas tradicionais, muitas delas identitárias da padaria artesanal de há muitos séculos atrás.

Pelo mesmo documento fica a saber-se que, na Europa, os homens estão a comer mais pão do que as mulheres, mas estas são mais criteriosas e comem uma maior variedade de pão.

Por seu lado, os jovens consomem cada vez menos, mas mais fora de casa, em consequência do fácil acesso a produtos embalados e à oferta do canal Horeca (hotelaria, restauração e catering) que privilegiam na sua alimentação.

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