Encontro: I Fórum da Habitação Pública de Setúbal – manhã (com fotos)

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Setúbal, 14 de junho (DICI) – A construção de uma nova política global e coerente, com maior envolvimento do Estado e em estreita articulação com as autarquias locais, foi defendida esta manhã pela Câmara Municipal de Setúbal num encontro sobre habitação pública.
 
“É necessário criar uma estratégia para a governança das políticas de habitação”, afirmou a presidente do município, Maria das Dores Meira, no I Fórum da Habitação Pública Municipal de Setúbal, a decorrer no Fórum Municipal Luísa Todi, cujo primeiro painel se centrou na “Política Nacional de Habitação – instrumentos, financiamentos, resultados e perspetivas”.
 
A autarca, ao lembrar “que a habitação é uma necessidade básica que desempenha papel fundamental para a melhoria da qualidade de vida das pessoas, para a competitividade das cidades e vilas e para a coesão social e territorial”, frisou que “é na habitação que é mais visível a diferenciação social entre as pessoas”.
 
Neste sentido, apontou, “entre a política, a habitação e a cidade, dever-se-iam desenvolver as políticas sociais de promoção de habitação pública que permitissem corrigir disfuncionalidades e falhas do mercado que, ainda hoje, prejudicam milhares de famílias”.
 
Um dos problemas indicados por Maria das Dores Meira em matéria de habitação passa pela inexistência de uma política pública continuada. “Houve uma política orientada para os benefícios do mercado, da especulação imobiliária e da banca que aumentou património e rendimentos à conta da promoção da propriedade habitacional.”
 
Uma política que, “na crise imobiliária de 2008, levou a que os bancos se transformassem nos maiores proprietários de habitação em Portugal”, com o Estado a assumir, neste contexto, “um papel meramente assistencialista, nada tendo feito pela maioria da população”.
 
A presidente da Câmara Municipal de Setúbal advertiu que, “mesmo com a habitação consagrada como direito constitucional, esteve-se demasiado tempo sem nada se fazer para fazer cumprir este direito”, paradigma que mudou com a publicação, em maio de 2018, da Nova Geração de Políticas de Habitação, ainda que sem os efeitos desejados.
 
“Passámos, em matéria de legislação, do oito para o oitenta em cerca de um ano e meio, fazendo com que o nada chocasse com o tudo, de uma prática continuada de escassez de apoios dados pelos sucessivos governos para a pulverização de iniciativas e a implementação de um conjunto de medidas avulsas que não fazem política coerente.”
 
Com a publicação da Lei de Bases da Habitação, em setembro de 2019, foram criadas condições para a existência de legislação efetiva, mais estruturada, e que pode constituir um ponto de partida para a construção de uma nova política, global e coerente, edificada em diálogo entre o Estado e o Poder Local.
 
Contudo, vincou a autarca, “a situação atual contém graves problemas no acesso à habitação, semelhantes em dimensão, impactes e intensidade aos da época em que, de facto, havia falta de casas devido à migração das populações para as cidades aquando da industrialização”, a qual é agravada pelas “desigualdades territoriais decorrentes das diferentes capacidades financeiras de cada município”.
 
Maria das Dores Meira frisou que a habitação não é uma área setorial e é muito mais do que a casa de cada um. “Não pode gerar guetos, não pode provocar ruas sem saída. Ter direito à habitação é ter direito à cidade e a todas as formas de acessibilidade, mobilidade e urbanismo.”
 
Neste sentido, a autarca afirmou que o município de Setúbal está a “avançar muito rapidamente” para o cumprimento destes objetivos, os quais são assegurados por um conjunto de políticas, planos e estratégias de futuro que procuram consagrar, em pleno, o direito à habitação.
 
Exemplos deste desígnio camarário são a aprovação da Estratégia Local de Habitação, integrada na visão de qualificação do concelho e que procura responder a problemas complexos de agregados que vivem em condições indignas há décadas, incluindo situações de carência habitacional, nas quais foram identificados 338 agregados prioritários.
 
Destaque, ainda, para a celebração de acordos de colaboração com o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, um no âmbito do programa 1.º Direito, para reabilitação dos edifícios de oito bairros de habitação pública municipal, no valor de 22 milhões de euros, outro ao abrigo do Porta de Entrada, para alojamento urgente e temporário de 73 agregados residentes na Quinta da Parvoíce.
 
O resultado do trabalho municipal nesta matéria pode ser também encontrado no Plano de Urbanização Setúbal Nascente, o qual prevê a construção, pelo Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana, de 1500 fogos de renda acessível, numa primeira fase, e de mais 2500 numa segunda fase.
 
A presidente da autarquia partilhou ainda que o município apresentou quatro propostas ao Plano de Recuperação e Resiliência para construção de habitação nova ao abrigo do 1.º Direito, três propostas para alojamento temporário e urgente para pessoas sem-abrigo e vítimas de violência doméstica e ainda mais 13 propostas para reabilitação de todos os edifícios dos bairros de habitação pública e de todas as habitações municipais, no âmbito do alargamento que o financiamento do Plano veio dar ao 1.º Direito.
 
Estas vinte propostas, evidenciou Maria das Dores Meira, “totalizam um Investimento de 336 milhões de euros”, o que se enquadra na estratégia da Câmara Municipal de Setúbal de “contribuir para reduzir o défice habitacional que existe em todo o país”.
 
Contudo, advertiu, para uma estratégia completa é necessária “uma maior participação do Governo central e a articulação com o Governo local”, bem como mais planeamento, reflexões e partilha, como a realizada em Setúbal, com o objetivo de “contribuir para a edificação das práticas e políticas de habitação necessárias às nossas populações”.
 
No primeiro painel do encontro organizado pela Câmara Municipal de Setúbal, a secretária de Estado da Habitação, Marina Gonçalves, reconheceu o desinvestimento de décadas do Governo em matéria de habitação pública e destacou o esforço de contraciclo que está a ser desenvolvido.
 
“A habitação é um pilar do Estado social. Falhou-se ao longo de muitas décadas porque não houve uma política estruturada”, afirmou a governante, para elencar um conjunto de “novas políticas que estão a ser implementadas para dar uma resposta concreta e transversal a problemas identificados”.
 
Entre os vários instrumentos no terreno, Marina Gonçalves destacou o programa 1.º Direito “para chegar às famílias com menos rendimentos”, o qual é apoiado por um Plano de Recuperação e Resiliência “mais robusto e capaz de contrariar o diagnóstico realizado no país” no que respeita à habitação pública.
 
A secretária de Estado salientou ainda a nova bolsa de alojamento urgente e prioritário, “uma rede de suporte de emergência para quem precisar”, dinamizada no âmbito da instituição de novas políticas públicas. “Estamos a aprender com aquilo que não se fez ao longo de anos para dar resposta a diversas carências habitacionais.”
 
Já o membro do Conselho Diretivo da Associação Nacional de Municípios Alberto e autarca de Vila Franca de Xira, Alberto Mesquita, defendeu “a desburocratização” dos procedimentos relacionados com a habitação pública, seja no acesso às casas, seja nos instrumentos necessários para a implementação de políticas locais.
 
Alberto Mesquita advertiu, igualmente, para a necessidade de o Estado conduzir “políticas de maior elasticidade, ou seja, adaptadas às características e especificidades dos diferentes municípios”, os quais, frisou, “têm assumido o papel de garantir o acesso das pessoas à habitação pública”.
 
Este responsável apontou as dificuldades de acesso à habitação pública, “um problema multidimensional” agravado por um “parque habitacional escasso e deteriorado e pelas dificuldades financeiras das famílias”.
 
A presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo, Teresa Almeida, afirmou que as novas políticas em curso “constituem mais uma oportunidade para resolver um problema de décadas”, para depois adiantar que o Plano de Recuperação e Resiliência, “ambicioso”, é a “resposta possível”.
 
Teresa Almeida indicou que “não basta construir ou recuperar fogos”, mas, sim, que é “necessário fazê-lo com qualidade e na perspetiva global de desenvolvimento urbano”.
 
O encontro prosseguiu com um painel subordinado à temática “Políticas Municipais de Habitação Pública – constrangimentos e potencialidades”, com as participações da secretária-geral da Associação de Municípios da Região de Setúbal, Sofia Martins, da presidente da Associação Portuguesa de Habitação Municipal, Paula Marques, e do vereador da Habitação na Câmara Municipal de Setúbal, Carlos Rabaçal.
 
O autarca setubalense, ao afirmar que “a política de habitação tem de dar resposta a todos os excluídos do mercado de arrendamento e compra”, apontou uma série de condicionantes para o cumprimento deste desígnio, como “os baixos rendimentos e a especulação dos solos e imobiliária”.
 
Carlos Rabaçal caracterizou alguns aspetos do atual panorama da habitação em Portugal. “Apenas 2 por cento do parque habitacional existente é pública e 35 por cento da população tem uma taxa de esforço de mais de 40 por cento com despesas de habitação.”
 
Sobre o que falhou nas últimas décadas, o autarca foi perentório ao apontar a falta de investimento do Estado, que “carece de uma alteração profunda de olhar, de pensamento e de perspetiva para dar uma verdadeira resposta nesta matéria”.
 
O vereador destacou o trabalho muito avançado que a autarquia tem vindo a realizar na esfera da habitação, dando como exemplo a Estratégia Local de Habitação para a década de 20/30 e as duas dezenas de operações com financiamento assegurado pelo Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana e pelo Plano de Recuperação e Resiliência.
 
“Vamos acabar com o único bairro de barracas em Setúbal, na Quinta da Parvoíce. Para isso, essas famílias vão ser temporariamente realojadas em casas do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, que assume o pagamento das rendas no prazo máximo de cindo anos.”
 
Contudo, alertou, o Plano de Recuperação e Resiliência não é solução definitiva. “É uma solução forte mas escassa para o problema. Já está esgotado com as propostas apresentadas”, afirmou. “Se as ações não forem comparticipadas a 100 por cento, não há, na grande maioria dos casos, capacidade de resposta municipal.”
 
A secretária-geral da Associação de Municípios da Região de Setúbal, Sofia Martins, ao defender “uma estratégia que olhe para as pessoas como pessoas”, apontou a aplicação dos fundos do Plano de Recuperação e Resiliência como o principal desafio das novas políticas de habitação.
 
Já a dirigente da Associação Portuguesa de Habitação Municipal Sara Fernandes afirmou que “as novas políticas de habitação são um passo importante, mas não são garante de nada”.
 
Deixou, ainda, um conjunto de críticas à burocracia e “à falta de informação para acesso a procedimentos e programas habitacionais”.
 
À tarde, o encontro foi retomado com a exibição do filme “Práticas da política de habitação em Setúbal”, a que se segue o painel “Experiências na gestão da habitação e participação de moradores”, moderado pelo vereador da Habitação da Câmara Municipal de Faro, Carlos Baía, com a partilha exemplos de práticas nesta área em Évora, Porto e Oeiras.
 
O painel conta com intervenções da coordenadora da Unidade de Habitação e Reabilitação Urbana da Câmara Municipal de Évora, Susana Mourão, da vice-presidente da DOMUS SOCIAL, Filipa Melo, e do presidente da Câmara Municipal de Oeiras, Isaltino Morais.
 
Após um período de debate e um intervalo para visitar a mostra “Setúbal para Morar”, na segunda parte do painel, moderado pela jornalista do Jornal de Negócios Filipa Lino, a chefe da Divisão da Habitação Pública da Câmara Municipal de Setúbal, Raquel Levy, partilha a experiência local.
 
Este painel conta ainda com uma intervenção de Helena Roseta sobre a participação de moradores na ótica da Lei de Bases da Habitação e a experiência do Programa “Bairros Saudáveis do qual é coordenadora. Em representação do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, Gonçalo Canto Moniz apresenta o projeto URBINAT e Giovanni Allegretti fala sobre “Participação e organização de moradores”.
 
O I Fórum de Habitação Pública Municipal de Setúbal termina por volta das 17h00, com a apresentação das conclusões e de contributos para práticas e políticas de Habitação Pública. 
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