Sempre agudamente consciente das suas capacidades, Rodrigo faz permanentemente questão de frisar que não é pianista no sentido clássico do termo, mas neste disco escreveu melodias que poderiam ser enaltecidas por alguém dotado de um pianismo mais sólido. Tentou em primeiro lugar desafiar o seu filho mais velho, António, que se viu impedido de participar no projeto devido a prementes solicitações académicas. Mas Rosa, a filha do meio, correspondeu à ideia de participar num disco que propunha diálogos a partir de dois pianos. Diálogos que foram depois adornados com arranjos, num dos casos até de um trio de cordas, missão que ficou a cargo da sua entusiasta filha mais nova, Sofia. Como se percebe, os filhos de Rodrigo estão todos embrenhados em avançados estudos musicais.
“Comecei por fazer umas bases simples para ser eu a tocar e sobre as mesmas fui compondo melodias um pouco mais difíceis para eles irem tocando comigo; no início parecia-me estranho, mas depois as peças começaram a juntar-se e tudo passou a fazer sentido e a fluir naturalmente”, explica-nos o compositor. “Nasceram assim os primeiros temas de Piano Para Piano. Desde Outubro de 2022 que comecei a trabalhar nestes novos temas e apesar de quase todos terem sido pensados para dois pianos, acabei mais tarde por incluir nalguns, sons de cordas, loops, e noutros uma vertente mais eletrónica. Acabou por ser um disco onde encontrei novas inspirações e influências graças ao convívio permanente com esta nova geração maravilhosa que é a dos meus filhos”. Um disco cheio de vida, de facto.
Rodrigo Leão também nos revela a matéria de que se fazem as suas composições: há em Piano para Piano peças que são dedicadas a pessoas concretas e reais - como “Rodant”, vénia de pai Rodrigo para filho António; “Neo”, que refere a carinhosa alcunha porque é tratado o seu sogro; “Gabi”, para a sua cunhada Gabriela e para um seu companheiro de venturas musicais de longa data, Gabriel Gomes; “Marzar”, homenagem à família de Goa; ou, por exemplo, “Pandu”, nome de um motorista de táxi e amigo que também conheceu em Goa, terra da sua mulher e mãe dos seus filhos. E há outros lugares que inspiram composições, como a sua amada Ericeira que se descobre em “Jagoz”.
Na verdade, em cada um dos temas há gente dentro e histórias, amizades de décadas e outras mais próximas - todas essas linhas se cruzam num disco em que Rodrigo e Rosa Leão dialogam de forma terna, num registo intimista que traduz a proximidade e cumplicidade que só um pai e uma filha podem partilhar. A vida de Rodrigo Leão poderia dar um filme, como tantas outras, mas felizmente tem servido para inspirar muitos discos. E talvez nenhum outro tanto quanto este. Piano para Piano é história de pai contada a uma filha sem que seja preciso dizer uma única palavra. Porque os pianos entendem-se bem. É assim a vida.
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