Portugal de Lés-a-Lés distribuiu esperança e animação em tempos estranhos
22.º Portugal de Lés-a-Lés
Lagos-Évora-Guarda-Chaves
1 a 4 de outubro 2020
A vitória da resiliência numa aventura sem igual
A coragem de acreditar
Nunca, em 22 edições, foi tão genuíno e esclarecedor o sorriso dos participantes na chegada ao final do Portugal de Lés-a-Lés. As caras de satisfação e os comentários de todos os aventureiros foram, sem dúvida, o prémio mais saboroso para uma organização que, contra ventos e marés, teimou e conseguiu dar um sinal positivo aos motociclistas, criando as condições para que todos voltassem aos grandes passeios. Um evento bem diferente de todos os anteriores, com limitações e cuidados redobrados, mil cautelas e o respeito absoluto pelas normas em tempo de pandemia, mas que se saldou por um êxito tremendo.
Uma resposta positiva à coragem de Federação de Motociclismo de Portugal em colocar na estrada a grande maratona mototurística, traduzida não só na adesão como, mais importante, no cumprimento das regras sanitárias e de todas as indicações dadas ao longo do evento. Foram pouco mais de mil, cerca de metade de anos anteriores, mas divertiram-se por dez mil e nem a chuva, o vento, o nevoeiro ou todas as incertezas minimizaram o prazer, há tanto adiado, de passear de moto.
Da Lacóbriga a Aquae Flaviae, passando por Ebora Cerealis e Lancia Oppidana do tempo dos romanos, os bravos lusitanos (e alguns estrangeiros) resistiram e lutaram contra os elementos ao longo de 1111 quilómetros de descoberta, honrando os feitos do mítico Viriato frente à ocupação do Império Romano. E nem a chuva, o vento e o frio conseguiram beliscar o entusiasmo de todos os que se apresentaram nas Verificações Técnicas e Documentais, mesmo ao lado das muralhas de Lagos. Processo ainda mais expedito – que não menos rigoroso! - graças à revisão de processos, mas também do empenho de todos os elementos de uma organização obrigada a adaptar-se aos novos tempos. Lés-a-Lés que já teve duração de 24 horas ‘non-stop’, já teve duas etapas de 12 horas, teve também prólogo e 2 etapas antes de chegar ao modelo atual com Passeio de Abertura e 3 etapas para cumprir a ligação entre dois extremos de Portugal Continental. Mas que, pela primeira vez, não teve controlos de passagem, evitando assim grandes aglomerados de participantes e o contacto com elementos dos moto clubes que, tradicionalmente, dão um colorido ímpar a estes pontos. E que mostrou também um novo modelo nas refeições, obrigada a abdicar do convívio da grande caravana em prol dos mais acolhedores restaurantes locais, proporcionando que os grupos estivessem juntos, mas com respeito das limitações gerais, ao mesmo tempo que contribuía para animar o carente comércio local.
Para Manuel Marinheiro este «foi o mais sofrido de todos os já realizados, saindo de Chaves com a sensação de dever cumprido e com uma enorme alegria por toda a magnífica equipa que conseguiu levar avante este Lés-a-Lés em toda a segurança». Para o presidente da Federação de Motociclismo de Portugal «só a entrega, a abnegação e o sentido de responsabilidade permitiram enfrentar uma situação tão complicada, permitindo aos motociclistas recuperar alguma normalidade nestes tempos tão estranhos». Pelo mesmo diapasão afinou António Manuel Francisco, considerando que este evento «foi muito importante para a alma dos mototuristas, representando uma conquista significativa perante todas as incertezas que rodeiam a sociedade, e foi, sem dúvida, o Lés-a-Lés mais difícil de organizar, saindo de Lagos sem a certeza absoluta de poder chegar a Chaves». Naquele que apelida de «Lés-a-Lés da resiliência», o responsável da Comissão de Mototurismo da FMP recorda que, «a qualquer momento, o evento podia ser parado e só com muita teimosia foi possível voltar à estrada numa festa mais pequena, mas nem por isso menos intensa e gratificantes para todos». Agora, é tempo de preparar o futuro pensando na próxima edição com a crença de uma boa notícia: É que só já faltam 9 meses para o Portugal de Lés-a-Lés 2021.
E todos disseram presente!
Adiado para de junho para o início de outubro, o Lés-a-Lés versão 2020 descobriu um Algarve bem diferente, com um tempo menos convidativo para uns banhos de mar, é certo, mas nem por isso menos interessante. A prova foi dada durante os 79 quilómetros do Passeio de Abertura, com passagem pelas históricas ruas de Lagos antes de um saltinho à costa lacobrigense, com tempo para desfrutar da imensidão atlântica a partir do novo passadiço da Ponta da Piedade. Mas também do areal e esplanadas da praia de Porto de Mós ou miradouro da Atalaia, de onde foi possível ver boa parte da costa finamente recortada, desde a praia da Luz até à ponta de Sagres. Paisagem soberba que se fez ‘cobrar’ com uma relaxante passeata pedonal até ao cimo da Rocha Negra, seguindo-se interessante visita à aldeia do Barão de São João onde os hippies dão um colorido especial e onde nem falta um Cristo de traços pós-modernos a tentar fugir da Cruz. Vá-se lá saber de quê…
Mas nem só de costa vive a região algarvia, e a subida à Serra de Espinhaço de Cão fez questão de o recordar uma vez mais. Apesar da pouca altitude, sem nunca chegar aos 300 metros, revelou zonas bastante ventosas. Justificação lógica para uma vegetação tipicamente mediterrânica, paisagem predominante em direção à Barragem da Bravura, obra do Estado Novo para represar Rio Arade que, nesta altura, pouco água recolhe. Do ponto mais a norte deste passeio, seguiu-se rumo ao mar, não sem antes dar um salto à... Escócia, aldeia que deu o primeiro cunho internacional à grande aventura. E que muito alegrou dois escoceses! Naturais de Edimburgo, Rob e Zayne Dagher assentaram arraiais em Pombal, há cerca de dois anos, dando seguimento a uma paixão de toda a vida. Criaram a Gusto Motorcycle que cria veículos exclusivos de três rodas, organiza passeios e representa a Ural, marca dos side-cars com que fizeram a estreia no Lés-a-Lés. No de estrada, porque no Off-Road já haviam participado em 2019, «para descobrir um País fantástico, belíssimo e com paisagens muito diversificadas. E gente tão acolhedora que dá vontade de regressar sempre». Claro que fizeram a foto junto à placa da pequena aldeia serrana e sentiram-se mais em casa. Tal como no dia seguinte, debaixo de chuva e nevoeiro em clima tão tipicamente escocês.
Depois, já no regresso à beira-mar, duas visões bem diferentes do Algarve, em perfeita complementaridade, com o que de mais puro e genuíno tem para oferecer, da história a tradições bem expressas no moinho de Odiáxere - propositadamente aberto para os participantes do Lés-a-Lés - até ao turismo, de vital importância na economia de toda a região. Aproveitando uma fantástica localização entre a Reserva Natural da Ria de Alvor e a Meia Praia, surge um conjunto residencial englobando um campo de golfe oferecedor de surpreendente harmonia entre os bem cuidados 'greens' e a vegetação autóctone. Além do mais com vistas fantásticas sobre o mar e toda a alvura de Lagos. Cidade que tão bem acolheu a caravana, oferecendo possibilidade de mais descobertas no Museu de Cera, na visita à caravela Boa Esperança, réplica daquela com Gil Eanes, famoso cidadão lacobrigense, dobrou o Cabo Bojador, ou no passeio de barco às grutas da Ponta da Piedade
Sorrisos à chuva
Esmiuçado o concelho de Lagos, mesmo se muito ficou por descobrir, rumou a norte a caravana, com saída madrugadora daquela que foi a capital do Algarve entre 1573 e 1755, perdendo o estatuto ao ser arrasada pelo tristemente mais famoso terramoto em Portugal. Sem tremores de terra ou temporais bíblicos, mas com chuva que haveria de acompanhar a caravana durante boa parte de uma etapa curta, de apenas 286 km, mas bem variada, o dia começou com uma rápida passagem pelo Autódromo Internacional do Algarve antes do início da subida da Serra de Monchique, com subida ao alto da Fóia, juntando-se aqui o nevoeiro e, logo à frente, o vento forte. Diluía-se assim uma boa hipótese para desfrutar das fantásticas paisagens prometidas pelo detalhado e bem ilustrado road-book. Vá lá que D. Sebastião, que daqui partiu com a poderosa armada de 800 barcos rumo a Alcácer Quibir, não surpreendeu nenhum motociclista, aparecendo do meio de tão denso nevoeiro, montado no seu garboso cavalo.
Condições climatéricas que aumentaram a exigência de um início já de si bem trabalhoso, em algumas passagens no meio de quintais, através de pequenos troços de empedrado e até terra batida transformada em traiçoeira lama que valeu as primeiras quedas, pequenas e sem qualquer gravidade. Haveria de continuar o vento forte, a puxar uns aguaceiros repentinos e muito intensos, surpreendendo aqui e ali na travessia de um Alentejo diferente do que é habitual ver no Lés-a-Lés, com o verde a dar lugar ao castanho escuro das terras revolvidas em tempo de preparação das sementeiras cerealíferas.
Paisagem que servia de mote a etapa com final na Ebora Cerealis, um dos celeiros nos tempos de presença romana na Península Ibérica, mas que antes ofereceria importantes brindes a um pelotão internacional que juntou norte-americanos, alemães, brasileiros, gregos, venezuelanos, franceses e suíços aos já referidos escoceses e a muitos espanhóis. Da Corunha a Barcelona, de Cáceres a Miranda do Ebro, de Barcelona a Tuy, de Málaga e Bilbao, de Granada a Madrid, de Valladolid a Valência, de San Sebastian a Salamanca. Mas também muitos portugueses emigrados na Suíça, França, Luxemburgo, Bélgica e Inglaterra que não perdem oportunidade de melhor conhecer as belezas da Pátria-mãe.
Passada a intricada, por vezes labiríntica serra de Monchique, onde o prazer de condução é oferecido em estradas como a N266 que haveria de levar até à Barragem de Santa Clara e depois na N123, rumo a outra represa artificial, a do Monte da Rocha que segura a escassa água do rio Sado que nasce por ali perto, seguiu-se o Alentejo. Mudança natural nas paisagens e dificuldades exponenciadas para os maiores aventureiros, aqueles que ousam atravessar o País em pequenas máquinas de 125 cc. Como o Miguel, de Sintra, que ‘viu-se e desejou-se’ «para manter o ritmo e não perder o contacto nem atrasar o grupo» aos comandos da pequena mas resistente Honda PCX. Com uma moto mais potente, a estreante Susana, colega de equipa e também sintrense de gema, já com mais de 100 mil quilómetros de experiência, não escondia o prazer da aventura «que devia ser obrigatoriamente realizado por todos os motociclistas pelo menos uma vez na vida! É duro, mas revelador de um Portugal extremamente bonito e muitas vezes desconhecido». Como as Minas de Aljustrel, a surpreendente Capela do Calvário, em Ferreira do Alentejo ou a ponte romana de Alfundão. Descobertas para guardar na memória durante a paragem na bonita vila de Alvito, em mais um Oásis onde água e sumos acompanham mais uma sande ou outro petisco regional, seguindo-se a passagem por Viana do Alentejo e pelo imponente Santuário de Nossa Senhora de Aires, um dos mais importantes no Alentejo dedicados ao culto mariano construído durante toda a segunda metade do século XVIII.
E, finalmente, Évora. Ou melhor, o palanque de chegada, porque a verdadeira descoberta da única cidade portuguesa que faz parte da Rede de Cidades Europeias Mais Antigas foi feito a pé. Do templo romano que muitos conhecem como sendo de Diana aos cafés da praça do Giraldo, da Capela dos Ossos à Sé, muitos são os atrativos de um centro histórico que foi declarado Património Mundial pela UNESCO, em 1986.
Mais dureza que revelou ainda mais beleza
O aviso já tinha sido dado na véspera. A partir da 2.ª etapa cresciam as exigências. Por força do superior número de quilómetros, mas também das estradas cada vez mais recurvadas à medida que se ia subindo no mapa nacional. A concentração e pontualidade eram altamente aconselhadas, perdendo o menos tempo possível com paragens desnecessárias para aproveitar o que realmente interessava. Como era o caso da parte final, na passagem pela Serra da Estrela.
Mas isso era apenas no final. Antes, na saída de Évora, temperaturas bem amenas, mesmo demasiado baixas para alguns participantes, próprias da época do ano, mas pouco usuais num Lés-a-Lés, que jamais fora realizado em outubro. As temperaturas podiam ser diferentes mas as estradas, essas não enganavam, com as longas retas ligando aldeias pontilhadas com casas brancas, de rodapés e molduras de portas e janelas em cores vivas. Como é o caso de Igrejinha, mesmo antes da chegada a Casa Branca onde Donald Trump não compareceu devido ao internamento hospitalar após ter testado positivo para o Covid-19. E como o respeito pelas normas sanitárias ditadas pelo DGS era imprescindível em defesa da saúde dos participantes, havia, pois, que arrepiar caminho até Aviz. O pequeno almoço, mudado do belíssimo centro histórico para o Oásis Honda – BP, podia ser saboreado logo à frente, nas margens da albufeira do Maranhão recuperando forças para apreciar a Ribeira de Sume, fenómeno geológico pouco depois de Vale de Açor, onde uma das maiores grutas graníticas da Península Ibérica faz com que as águas da Ribeira de Sôr desapareçam (ou sumam) durante 250 metros, debaixo daquilo que parece o leito seco de um rio.
Gavião e Belver foram, por seu turno, mais um prova evidente dos enormes cuidados no respeito pelas regras de distanciamento aconselhadas nesta fase, ditando a mudança de um Oásis e de uma visita ao castelo. Mas não obrigaram a alterar as espetaculares descidas para o rio Tejo e rumo à Ribeira de Eiras, onde a mudança de paisagem era cada vez mais evidente. Estradas muito interessantes em termos de condução, mas com um enquadramento por vezes deprimente, culpa dos incêndios que, ano após ano, queimam aquilo que parece já não poder arder. Estradas quase desertas, para desfrutar até chegar a Tinalhas e a um dos mais impressionantes Oásis do ano, montado pelo Moto Clube d’Atestar. Que fez questão de mostrar ao mundo a indelével homenagem à FMP e ao Lés-a-Lés gravada no granito, juntamente com a majestosa estátua do Arcanjo S. Rafael, designado em 2003, pelo Papa João Paulo II, como padroeiro dos motociclistas. E onde, além de deliciosa bifana, foi possível apreciar as grandes novidades para 2021 do catálogo de capacetes da NEXX.
Depois de um dia particularmente solarengo na travessia do Alentejo, a aproximação à Estrela fez reaparecer o temor da chuva, com as nuvens cobrirem a serra mais alta de Portugal Continental, antes mesmo da chegada a Unhais da Serra onde o Moto Clube da Covilhã - Lobos da Neve preparara excelente receção, condizente com o enorme entusiasmo que vêm mostrando em prol do motociclismo. Aconchego ao estômago em local muito agradável antes de atacar os quilómetros finais, rumo à Guarda, com promissora passagem pela Serra da Estrela.
E se muito prometia, mais cumpriu com espetacular passagem pelo vale glaciar da Ribeira de Altorfa, com direito a um pouco de off-road, subindo ao ponto mais alto deste Lés-a-Lés, a cerca de 1600 metros de altitude, antes de iniciar a descida para a Guarda. Viagem pela Nave de Santo António, passagem em Manteigas e continuação pelas N232, ao longo do rio Zêzere, e pela N18-1, estradas que não ficam nada atrás, em termos de espetacularidade e condução, das míticas Transfagarasan, na Roménia, a francesa Grand Corniche ou a austríaca GrossGlockner. Uma chegada à cidade mais alta de Portugal a fazer jus a um dos cinco F’s que a caraterizam, com muito Frio, para, ao jantar, nos mais diversos restaurantes, recordar outros dos F’s, de Farta.
Chegada triunfal a Chaves
Continuando a fotogenia do dia anterior, a 3.ª etapa partia cedo da Guarda, mas ainda a tempo de confirmar outro F, de Formosa. Voltaremos para atestar os epítetos de Forte e Fiel da antiga Oppidana, talvez com um tempo mais agradável que o desta despedida, obrigando a vestir os fatos de chuva para rumar a Pinhel, sempre com temperaturas bem baixas. Condições que desencorajaram a que se juntassem diversos participantes para, todos juntos e pelo menos em número de 9, conseguirem abraçar os quase dez metros do tronco do castanheiro gigante de Guilhafonso que conta, segundo dizem, mais de 400 anos de vida. O maior exemplar da Castanea sativa existente na Europa foi um dos primeiros atrativos de uma etapa muito fotogénica, que continuou com a anta da Pêra do Moço, monumento funerário do Período Neo-Calcolítico.
Maior animação em Pinhel onde, após a passagem pelo castelo, houve direito a reforço alimentar bem no centro da cidade Falcão, com o pequeno-almoço entregue sob olhar atento de uma ave de rapina à escala real… humana. Boa disposição materializada num boneco, vestido por uma voluntária, e que há mais de 700 anos representa a cidade beirã, estando mesmo presente no brasão concelhio, depois do título outorgado por D. João I e que os pinhelenses usam com orgulho. Momento histórico na Cidade do Vinho 2020-2021 antes de voltar à estrada, pela fantástica N221 em direção ao rio Côa, quando o sol já secava o asfalto e levava muitos participantes a despir os fatos de chuva. Paragem aproveitada para trincar uma peça de fruta ou uma sande com contorno paisagístico de eleição e onde nem faltou a visita de numeroso bando de grifos. Imagens bem diferentes dos dias anteriores na abordagem a Castelo Rodrigo, uma das 7 Maravilhas de Portugal no que às aldeias históricas diz respeito.
Do castelo à sede de concelho, Figueira de Castelo Rodrigo, a entrada no Parque Natural do Douro Internacional reforçou a mudança paisagística, bem apreciado no miradouro da Sapinha, com vistas desanuviadas sobre o rio Águeda no preciso local onde aumenta o caudal do Douro. Local de eleição para mais uma paragem, em Oásis estrategicamente colocado para permitir a internacionalização do Portugal de Lés-a-Lés, autorizando um saltinho a Espanha para o que bastava cruzar a ponte sobre o Águeda. Mas, numa etapa altamente fotogénica, muito mais estava por ver, começando nas imponentes escarpas que ladeiam o Ribeiro de Mosteiro, formação geológica de quartzitos com 450 milhões de anos, e continuando pelas marcas deixadas pelos romanos na região, como a pequena ponte e a Calçada de Alpajares ou Calçada do Diabo.
Para digerir tamanha imponência geológica e histórica, nada como umas curvas deliciosas, rumo a Freixo-de-Espada-à-Cinta, no regresso à rápida e bonita N221 que haveria de acompanhar a caravana até Mogadouro. Pelo meio, duas escapadas de ‘luxo’ através de algumas estradinhas municipais, mais lentas e contemplativas: a primeira para ver o Cavalo de Mazouco, por muitos apontada como a primeira gravura rupestre ao ar livre em toda a Europa; a segunda para vislumbrar o vale do Douro numa das suas vistas mais imponentes a partir do Miradouro do Carrascalinho.
Sempre com a N221 como linha orientadora, Mogadouro foi paragem para retemperar muitos estômagos mais carentes antes da descida ao Rio Sabor, com algumas nuvens ameaçadoras no horizonte, mas que, felizmente, haveriam de dar em nada. Já dentro do concelho de Macedo de Cavaleiros, nova paragem na albufeira do Azibo onde o moto clube local deu as boas-vindas ao Nordeste Transmontano, seguindo-se, poucos quilómetros adiante, a visita mais carnavalesca de todas, a Podence, cujos famosos caretos com que festejam o Entrudo são, desde fevereiro, Património Imaterial da Humanidade. De Macedo a Torre de Dona Chama, sempre por estradas secundárias bem interessantes, oportunidade para apreciar nova mudança de paisagem, com os grandes vinhedos do Côa a darem lugar a olivais e vinhas bem mais pequenas, dos produtores locais e destinadas, sobretudo, a consumo próprio. E com o sol a brincar as escondidas, ora aparecendo em força, ora dissimulando-se atrás de ameaçadoras nuvens negras, lá seguiu o pelotão para apreciar a famosa Berroa ou Porca (ou será uma ursa?) e o Pelourinho da vila do concelho de Mirandela cuja lenda aponta a origem do nome para a fundação por uma nobre senhora, Dona Châmoa Rodrigues. Que, conta a fábula, tinha um rosto tão bonito quanto feios eram os pés, que de defeituosos mais pareciam os de uma cabra.
Incólumes às ameaças de chuva e animados por ter Chaves cada vez mais perto, cumprindo a totalidade do percurso, algo que à partida muitos colocavam ainda em dúvida, os maratonistas viveram final espetacular, sempre junto à fronteira com Espanha, de beleza condizente com a excelente jornada mototurística que foi o 22.º Portugal de Lés-a-Lés. Na cascata de Segirei apreciando território de nuestros hermanos, tentando mover a famosa Pedra Bolideira ou fotografando o célebre marco zero da cada vez mais concorrida N2, os participantes iam dizendo adeus a evento único, com uma organização que encontrou imensas dificuldades para levar o evento a ‘bom porto’ mas que, finalmente, nas margens do Tâmega depois da passagem exclusiva pela ponte romana de Trajano, mereceu aplausos de todos. O adiamento desde junho para esta altura do ano, por força da pandemia que parou o Mundo, criou muitas dores de cabeça, é certo, mas deixou uma boa notícia: É que só já faltam 9 meses para a próxima edição.
O Gabinete de Imprensa
Portugal de Lés-a-Lés
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