Em menos de 6 meses, novo recorde de 123 milhões de pessoas deslocadas. Portugal com ACNUR alerta para o agravar da situação com a chegada do inverno.
O número de pessoas deslocadas voltou a aumentar e a bater um novo recorde: são já 123 milhões. Uma última atualização antes de o ano terminar e que resulta do número crescente de conflitos, que obrigam milhões de pessoas a deslocarem-se dentro do seu país ou para territórios vizinhos em busca de abrigo e segurança, e também da falta de financiamento e esforços para resolver crises humanitárias de longa data.
“Em junho, a Agência da ONU para os Refugiados dava conta de mais um infeliz marco histórico com o alcançar da meta dos 120 milhões de pessoas deslocadas. Agora, menos de 6 meses depois, falamos de um novo recorde e de mais 3 milhões de pessoas forçadas a fugir num tão curto espaço de tempo. É uma realidade assustadora e que nos deixa com muito receio em relação ao próximo ano, sobretudo na ausência de soluções reais e duradouras à vista e com o financiamento disponível para apoiar estas pessoas a escassear a grande velocidade”, constata Joana Feliciano, Responsável de Marketing e Comunicação da Portugal com ACNUR.
Receios que ganham uma nova dimensão com a chegada do inverno. “No inverno tudo piora”, realça Joana Feliciano, utilizando o mote da nova campanha solidária que o parceiro nacional do ACNUR está a lançar este Natal para alertar e sensibilizar para o impacto dos invernos rigorosos nas precárias condições de vida das pessoas deslocadas. “Em países como a Ucrânia, o Líbano, o Afeganistão ou a Síria, existem milhões de pessoas que foram forçadas a fugir das suas casas e que terão de enfrentar agora invernos rigorosos, com temperaturas muito baixas e tempestades constantes, em abrigos temporários, sem meios para se aquecerem e, muitas vezes, sem acesso à saúde ou condições para garantirem a sua alimentação básica. Claro que isto irá agravar, e muito, a sua situação, pondo inclusive em causa a sua sobrevivência”, alerta.
O inverno rigoroso sentido na Jordânia obriga milhares de refugiados a recorrer ao ACNUR para garantir a sua sobrevivência. © UNHCR/Claire Thomas
Relatos idênticos chegam diretamente do campo de refugiados de Azraq, na Jordânia, onde uma avó conta que muitas vezes acaba por ficar com os pés congelados durante a noite para proteger e cuidar das suas netas. "As noites aqui são muito frias. Uso o meu cobertor para as cobrir, e só quero que elas fiquem quentes. As noites são muito, muito geladas, e os meus pés ficam congelados durante toda a noite", relata. Já na Ucrânia, uma mulher residente na vila de Kyselivka realça as dificuldades para garantir as condições básicas para a sobrevivência da sua família: "Antes da guerra, o inverno era muito mais fácil. Estamos a tentar regressar ao que tínhamos antes da guerra, mas está tudo mudado. Não se consegue comprar o que precisamos. Simplesmente não há".
O ACNUR está no terreno a apoiar estas populações com bens e materiais para colmatar os efeitos dos invernos rigorosos, mas a falta de financiamento continua a ser o principal impedimento à ajuda humanitária. “Temos estado a preparar as populações deslocadas com kits térmicos para se manterem quentes que incluem sacos-cama, mantas e cobertores, roupa de inverno, etc.; botijas de gás e aquecedores; estamos também a construir abrigos e a reconstruir habitações e outros edifícios; e garantimos apoio financeiro para que as pessoas possam elas próprias comprar os bens que mais necessitam, dignificando as suas escolhas. Os esforços estão a ser feitos, mas com as emergências cada vez mais subfinanciadas torna-se impossível dar resposta a todas as necessidades destes milhões de pessoas”, explica Joana.
Crise no Líbano agrava-se e ACNUR teme forte deterioração das condições de vida
A emergência do Líbano é uma das que gera maiores preocupações. “É um novo conflito que acaba de emergir e que em menos de 2 meses já gerou um fluxo de mais de 1.3 milhões de pessoas deslocadas. Estamos a falar de uma situação complexa a nível humanitário numa região já muito afetada pela deslocação forçada e uma grande instabilidade”, reforça a Portugal com ACNUR. O intensificar do conflito com Israel levou a que milhares de libaneses procurassem refúgio nos países vizinhos da Síria e Iraque e também fez com que milhares de refugiados sírios acolhidos no Líbano fossem forçados a voltar às suas terras, mesmo sem condições para tal.
Na Síria, o ACNUR já está a apoiar a população refugiada do Líbano e os sírios que foram obrigados a regressar ao seu país com ajuda humanitária e assistência para o inverno. © UNHCR/OVivian Toumeh
Uma emergência humanitária que se agrava de dia para dia e que pode sofrer agora um novo revés. O parceiro nacional da Agência da ONU para os Refugiados revela que “o ACNUR receia que as condições de vida das pessoas afetadas pela escalada do conflito no Líbano se agravem com o início do inverno”. O que fez com que o ACNUR mobilizasse de imediato as suas equipas no terreno e tenha já começado a enviar assistência essencial para o inverno às famílias recém-chegadas à Síria. É de recordar que a Síria experiencia uma crise humanitária sem precedentes há mais de 13 anos - com 7.2 milhões de pessoas deslocadas internamente no país e 90% da população a necessitar de assistência humanitária - e que os libaneses e os refugiados sírios que retornem ao país irão encontrar um território totalmente destruído, com habitações e infraestruturas danificadas, serviços básicos em colapso e uma crise económica profunda.